Há um artigo, das Notas Contemporâneas, especialmente significativo para esclarecer o sentido da santidade em Eça. É o que se intitula «Um santo moderno».
A valorização da santidade segue aí caminho semelhante ao que encontramos na nota sobre Antero.
Igualmente, vem à baila a menção do egoísmo que o romancista pretende encontrar na santidade «católica» (como se o Catolicismo não tivesse visto desde o princípio Deus como Amor…).
E para exaltar a dinâmica filantrópica, mais precisamente da caridade, do falecido cardeal de que está a falar, escreve Eça:Dentro das limitações do tempo e da doutrina – foi um S. Paulo e um Karl Marx.
Numa carta de Fradique Mendes, exalta-se Buda, contrapondo que a «justiça, segundo Jesus, só aproveita egoisticamente ao justo»…
O tema da santidade surge de passagem, uma vez ou outra, n’Os Maias.
Afonso da Maia aparece aureolado duma respeitabilidade que se expressa em mais do que um passo em termos de santidade.
É o que se verifica, por exemplo, nestas palavras de Maria Monforte ao seu marido Pedro:
Teu pai é um espécie de santo… Ainda o não merecemos.
Noutras ocasiões, o mesmo Afonso da Maia e até Maria Eduarda são louvados em virtude de acções claramente classificáveis de franciscanas.
Quaisquer que tenham sido os erros, não raro graves, na apreciação que Eça fez da santidade e, paralelamente, do Cristianismo, a verdade é que estes lhe mereceram cultas, repetidas e certamente longas meditações.
Quando o tema aparecia nos seus textos, a ironia dava lugar à seriedade.
* A fotografia representa naturalmente Eça e a esposa, D. Emília de Castro.
A posição do romancista na cadeira é certamente devida à doença.
* Penso que D. Emília de Castro terá tido sobre Eça de Queirós uma influência maior do que geralmente se imagina.
* Quem quiser ler duas das suas cartas ao marido clique aqui: http://www.eseq.pt/trab_profs/cartas_da_esposa_de_eca.htm
José Ferreira
+ «E Jesus disse-lhes: Ide pelo mundo inteiro
e proclamai o Evangelho a toda a criatura.
Quem acreditar e for baptizado será salvo;
mas quem não acreditar será condenado».
(Mc 16, 15-16)
segunda-feira, fevereiro 06, 2006
Temática Religiosa em Eça de Queirós – 4
Temática Religiosa em Eça de Queirós – 3
Eça manifesta, nalguns passos da sua obra, um conceito muito nobre de santidade.
É com certeza ao falar de Antero que ele melhor revela o que por tal entende.
Depois de sintetizar a filosofia moral do poeta dos Sonetos nas palavras:
“Em resumo, a lei moral do homem é o constante aperfeiçoamento e a progressiva santidade”, passa a falar da sua vida em Vila do Conde.
Fá-lo em termos elucidativos:A vida de Antero, em Vila do Conde, era então verdadeiramente edificante — e constituía, sem doutrina, um forte ensino moral.
O velho Santo Antão, no monte Colzin, não vivia um viver mais puro, mais entregue ao ideal, à Vida Eterna, do que Antero naquela casa de Vila do Conde, simplificada até ao cenobitismo, e onde por único adorno, além de livros numa estante de pinho, havia flores de sebes em púcaros de barro.
E mais adiante:
Fora desses cuidados, ele só se ocupava com o aperfeiçoamento da sua alma, ou, como diria um católico, com a sua “salvação”.
Não a salvação individual e egoísta, como a dos Santos – mas a salvação de todos, salvação para todos, penetração no Bem próprio, para dele fazer um instrumento do Bem universal.
Fala ainda de «intensas meditações em que a sua vida se confundia na vida do Ser, num desejo permanente de sentir, na sua consciência de homem, latejar a consciência do Universo».
Podia continuar-se a fazer citações desta nota, que, recorde-se, se intitula «Um Génio que era um Santo».
Mas não o vou fazer, antes vou observar que no ideal místico, nela exposto, há muito de panteísmo e talvez de budismo.
E não deve esquecer-se que Antero apetecia um Deus pessoal, e não essa diluição no Ser de que falam as citações.
* A fotografia acima representa a casa que Antero de Quental habitou em Vila do Conde.
* Santo Antão foi um anacoreta egípcio, do séc. IV, que marcou a história do monaquismo.
* Uma vez que temos uma visitante brasileira assídua, lembro que A Aia foi originalmente publicada por um jornal do Rio de Janeiro.
* Continuo aqui o trabalho que vinha a desenvolver em:
http://nova-evangelizacao.blogspot.com/
José Ferreira